quarta-feira

PEPI, LUCI, BOM E OUTRAS GAROTAS DE MONTÃO

PEPI, LUCI, BOM E OUTRAS GAROTAS DE MONTÃO (Pepi, Luci, Bom y otras chicas del montón, 1980, Figaro Films, 82min) Direção e roteiro: Pedro Almodovar. Fotografia: Paco Femenia. Montagem: José Salcedo. Figurino: Manuela Camacho. Produção executiva: Félix Rotaeta. Produção: Pepón Coromina, Pastora Delgado, Ester Rambal. Elenco: Carmen Maura, Eva Siva, Alaska, Félix Rotaeta, Cecilia Roth, Julieta Serrano. Estreia: 27/10/80

Antes de tornar-se o cineasta espanhol mais respeitado de seu tempo, já tendo conquistado, até agora, dois Oscar - filme estrangeiro por "Tudo sobre minha mãe" e roteiro original por "Fale com ela" - Pedro Almodovar construiu uma carreira admirável na Madrid underground. Trabalhando como diretor de filmes em super-oito nos momentos de folga de uma companhia telefônica, ele também dividia seu tempo escrevendo quadrinhos e fotonovelas cômicas e obscenas. Não demorou muito, visto esse currículo que apontava claramente para seu talento de contador de histórias, para que ele finalmente chegasse ao cinema propriamente dito. Seu primeiro filme - feito com a ajuda de amigos, entre os quais a protagonista Carmen Maura - reflete claramente a época em que foi realizado e ao mesmo tempo define o estilo que faria dele um nome reconhecível no mundo inteiro.

"Pepi, Luci, Bom e outras garotas de montão" é um filme para fãs de Almodovar em particular e de trashs bem-humorados em geral. Filmado no período de dois anos, nos dias de folgas dos atores e técnicos, é uma comédia transgressora em quase todos os níveis: o visual é sujo e desprovido de glamour, o humor é corrosivo e obsceno, os atores são quase todos amadores, existe erros de enquadramento e os personagens são mais estereótipos do que seres humanos. Mesmo assim, é divertido e tosco na medida exata para tornar-se cult. Narrado de forma quase convencional - apesar da trama bizarra e dos cartões explicativos que imediatamente traem a origem fotonovelesca de seu criador - o primeiro filme de Almodovar não se presta a análises psicológicas ou estéticas: é simplesmente a forma de expressão mais apropriada a um narrador em ebulição.


Pepi (Carmen Maura) é uma jovem que mora sozinho em um subúrbio de Madri, sendo sustentada pelos pais. Ela tenciona ganhar dinheiro vendendo sua virginidade, mas acaba sendo estuprada pelo policial (Felix Rotaeta) que mora no prédio em frente ao seu. Em busca de vingança, ela pede a um grupo de músicos underground de seu círculo que o espanquem, mas quem acaba sendo vítima da revanche é seu irmão gêmeo. Frustrada em suas intenções, Pepi aproxima-se da mulher do policial, Luci (Eva Siva), uma mulher reprimida e infeliz no casamento que acaba se apaixonando por Bom (Alaska), vocalista do grupo musical que espancou seu cunhado. A relação entre Luci e Bom vai adiante, para desgosto do policial, que não desiste da intenção de reconquistar a esposa. Enquanto isso, as três amigas divertem-se na noite madrilenha, frequentando as mais estranhas festas e convivendo com tipos dos mais esquisitos - como a mulher barbada casada com um homossexual enrustido e os criadores de um concurso de ereções.

O universo de Pedro Almodovar é retratado com precisão em "Pepi, Luci, Bom". O mundo noturno underground de Madri é o pano de fundo para uma história sobre a liberdade, o desejo e a amizade feminina - temas que serão tratados com mais delicadeza e profundidade na sua obra posterior. Mesmo que seu final seja um tanto agridoce - e a forma com que a liberdade de uma personagem é praticamente inaceitável para outras seja alheia aos dogmas posteriores de sua filmografia - ele reitera, como poucos, a maneira distorcida do cineasta em criar personagens que fogem ao padrão comercial. Mesmo que esteja muito distante da excelência de seus filmes mais refinados, seu primeiro trabalho é o pontapé inicial de uma obra única e indispensável.

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