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JUNTOS PELO ACASO

JUNTOS PELO ACASO (Life as we know it, 2010, Village Roadshow Pictures, 114min) Direção: Greg Berlanti. Roteiro: Ian Deitchman, Kristin Rusk Robinson. Fotografia: Andrew Dunn. Montagem: Jim Page. Música: Blake Neely. Figurino: Debra McGuire. Direção de arte/cenários: Maher Ahmad/Cindy Carr. Produção executiva: Bruce Berman, Denise Di Novi, Joe Hartwick Jr., Katherine Heigl, Nancy Heigl, Scott Niemeyer, Norm Waitt. Produção: Paul Brooks, Barry Josephson. Elenco: Katherine Heigl, Josh Duhamel, Josh Lucas, Melissa McCarthy. Estreia: 02/10/10


Se existe um gênero cinematográfico dentro da indústria americana que é incapaz de sobreviver sem regras impostas e consagradas por vários sucessos de bilheteria, esse gênero é a comédia romântica. Enquanto houver público para histórias de amor recheadas de piadas ingênuas e heroínas sonhadoras, Hollywood continuará lançando, várias vezes sem muito critério, tramas que seguem o tradicional esquema “moça encontra rapaz, se apaixona por ele e precisa ultrapassar diversos obstáculos para realizar seu sonho de subir ao altar” não cessarão de chegar às telas – com resultados os mais diversos. Volta e meia acrescentando ingredientes modernos à receita – como forma de mostrar que apesar da evolução social as pessoas continuam as mesmas há séculos – as comédias românticas que fizeram a glória de atrizes como Doris Day, Meg Ryan e Sandra Bullock (antes que esta acreditasse que pode ser uma atriz dramática convincente e levasse parte da Academia em seus devaneios) começaram o novo milênio discutindo temas como feminismo e igualdade de gêneros, sem nunca abandonar seu DNA temático. É isso que acontece, por exemplo, com “Juntos pelo acaso”, estrelado por uma das mais frequentes estrelas do cinema neo-romântico dos últimos anos, a insossa Kathryn Heigl.
           
Famosa por seu trabalho na série de TV “Grey’s Anatomy” – onde vive, para nenhuma surpresa, uma residente mais preocupada com a vida sentimental do que com os pacientes – Heigl aos poucos tornou-se a queridinha dos órfãos de Ryan e Bullock. Com filmes como “Vestida para casar” e “A verdade nua e crua”, Heigl assumiu uma lacuna que a fez rapidamente firmar-se no cinema, mesmo que fazendo, rigorosamente, o mesmo papel em todos os seus filmes. Em “Juntos pelo acaso”, ela não sai de sua zona de conforto, unindo-se ao charmoso e carismático Josh Duhamel (o sr. Fergie) e a um fotogênico bebê para contar mais uma história de amor que, a despeito de não acrescentar nada de relevante a seu currículo, tem a vantagem de ser, ao menos, divertida e ágil. É mais do mesmo, previsível e longo em excesso, mas o filme de Greg Berlanti ao menos está longe de ser irremediavelmente medíocre como muitos dos seus congêneres.



A trama começa em 2007, estabelecendo de cara a antipatia gratuita que surge entre a certinha Holly (vivida por Heigl, quem mais?) e o simpático porém levemente irresponsável Messer (Josh Duhamel): o encontro às escuras promovido por seus melhores amigos é desastroso e os minutos seguintes fazem questão de mostrar que não existe a menor sintonia entre os dois, que acabam por se tornar os padrinhos da linda Sophie, filha do casal que tentou em vão uní-los. Logo depois do primeiro aniversário do bebê, porém, a vida de ambos irá sofrer um abalo inesperado que os obrigará a uma convivência muito mais próxima do que poderiam desejar: a linda menina fica órfã depois de um acidente de carro e o casal (que se detesta e não faz questão de esconder tais sentimentos) descobre que foram escolhidos como seus guardiões, precisando, para isso, morarem juntos na bela e confortável casa de seus falecidos amigos. Logicamente a situação pega a todos de surpresa, e Holly – que está em vias de expandir sua confeitaria – e Messer – um diretor de transmissão de jogos de basquete tentando um salto na carreira – aos poucos passam a conviver com a rotina de criar um inocente bebê de um ano de idade.
            
O tema da maternidade/paternidade súbita já foi tratado no cinema americano no final dos anos 80 – um período em que os EUA viviam uma onda de conservadorismo quase obsessiva, impulsionada principalmente pela epidemia da AIDS – em filmes como “Presente de grego” (estrelado por Diane Keaton) e “Três solteirões e um bebê” (refilmagem de um original francês que lotou cinemas país afora com a presença de Tom Selleck). Portanto, a ideia do roteiro não é exatamente nova, como também não é novo o seu desenvolvimento. Tudo que acontece em “Juntos pelo acaso” pode ser adivinhado com várias cenas de antecedência – assim como o desfecho tradicional e a inclusão de um terceiro vértice amoroso na trama, como forma de “complicar” a situação. Tal vértice surge na imagem de Sam (Josh Lucas), um pediatra divorciado que se encanta por Holly e a faz questionar seu relacionamento sui generis com Messer. Mais uma vez, não é um elemento dos mais criativos, mas acaba funcionando como mais uma peça de engrenagem dentro de um gênero com suas regras muito bem definidas e quase imutáveis. O público parece não se importar com tanta previsibilidade: o filme rendeu mais de 60 milhões de dólares somente no mercado doméstico (EUA e Canadá).
            
Mas, apesar dos pesares, “Juntos pelo acaso” não é, como afirmado anteriormente, um suplício para aqueles que – não-fãs do gênero – se arriscarem a uma sessão. Katherine Heighl e Josh Duhamel tem química, o roteiro consegue criar uma ou outra situação realmente engraçada (como a visita de uma assistente social logo depois que os dois “pais” se deliciaram com um bolo de maconha) e os personagens secundários são simpáticos e comentam a ação com uma certa dose de ironia em relação ao american way of life (todos os vizinhos se encantam por Messer, inclusive as mulheres casadas e o casal gay). No fim das contas, a receita casal atraente + piadas no meio termo entre a ingenuidade e a ousadia + bebê engraçadinho funciona mais uma vez para quem procura um passatempo leve e agradável. Não muda a vida de ninguém, mas nem sempre um filme precisa carregar nas costas a pretensão de transformar o mundo ou a indústria, não é verdade?

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