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BRINCANDO DE SEDUZIR

BRINCANDO DE SEDUZIR (Beautiful girls, 1996, Miramax Films, 112min) Direção: Ted Demme. Roteiro: Scott Rosenberg. Fotografia: Adam Kimmel. Montagem: Jeffrey Wolf. Música: David A. Stewart. Figurino: Lucy W. Corrigan. Direção de arte/cenários: Dan Davis/Tracey A. Doyle. Produção executiva: Bob Weinstein, Harvey Weinstein. Produção: Cary Woods. Elenco: Matt Dillon, Timothy Hutton, Noah Emmerich, Michael Rapaport, Rosie O'Donnell, Lauren Holly, Martha Plimpton, Max Perlich, Natalie Portman, Mira Sorvino, Uma Thurman, Pruitt Taylor Vince, Sam Robards, David Arquette, John Carrol Lynch. Estreia: 09/02/06

Esta é uma história real: na metade da década de 90, enquanto esperava por uma resposta em relação à sorte de um trabalho seu para um grande estúdio de Hollywood, o roteirista Scott Rosenberg voltou à sua cidade natal, no estado de Massachusetts, para fugir da tensão da situação. Lá, ao lado de amigos de infância, percebeu, quase como uma epifania, o quão imaturos todos eles eram, incapazes de aceitar o fato de que estavam chegando aos 30 anos e totalmente despreparados para assumirem compromissos sentimentais. Ciente de que tal estado de espírito também dizia respeito a quase todos os homens de sua geração - e talvez das anteriores e posteriores - Rosenberg partiu para a ação e escreveu "Brincando de seduzir", uma comédia cáustica, romântica e um tanto cínica sobre ele mesmo em particular e os homens em geral. Dirigido por Ted Demme - recém vindo do ácido "O árbitro" - e estrelado por um grupo de jovens atores e atrizes que se dividiam entre iniciantes e veteranos, o filme fez pouco barulho nas bilheterias, mas é, sem dúvida, um retrato fiel e - por que não? - encantador da amizade entre homens.

Willie Conway (Timothy Hutton caprichando no visual desleixado) toca pianos nos bares de Nova York enquanto espera sua grande chance de tornar-se rico e famoso. Namorando há anos a compreensiva advogada Tracy (Annabeth Gish), ele retorna à sua cidade natal para um reencontro com os colegas do ginasial, a quem não vê há anos - assim como seu pai e seu irmão caçula, que desde a morte de sua mãe entraram em uma rotina triste e sem expectativas. Chegando a seu destino, ele imediatamente conhece a nova vizinha, a adolescente Marty (Natalie Portman), que mesmo aos 14 anos, não hesita em flertar com o forasteiro - que, logicamente, sente-se atraído pelo frescor e juventude da menina. Seu desequilíbrio diante de um belo espécime do sexo feminino é compartilhado com seus outros amigos, conforme ele vai percebendo ao encontrá-los: Tommy (Matt Dillon), o galã da cidade, namora com a bela e dedicada Sharon (Mira Sorvino), mas mantém há tempos um caso com uma mulher casada, Darian (Lauren Holly). Seu sócio no negócio de limpar neve das calçadas é Paul (Michael Rapaport, sempre bom em papéis de homens bobalhões), que não se conforma com a traição da namorada, Jan (Martha Plimpton) e vinga-se dela atravancando sua garagem com detritos das tempestades que não param de chegar. O único da turma que parece feliz é Michael (Noah Emmerich), casado, pai de dois filhos e imune às tentações da carne - sempre ironizadas pela sarcástica Gina (Rosie O'Donnell). As noitadas regadas a bebida e reminiscências são abaladas, porém, com a chegada de Andera (Uma Thurman), a bela e independente prima de um amigo em comum que mexe com a libido de todos.


É difícil de acreditar que antes de "Brincando de seduzir" apenas um outro roteiro de Scott Rosenberg havia chegado às telas - e de um gênero totalmente distante, o policial "Coisas para se fazer em Denver quando você está morto", lançado em 1995. Dotado de ritmo, consistência dramática e personagens críveis e pateticamente humanos, o texto de Rosenberg flui com extrema naturalidade, chegando até ao espectador sem soar presunçoso ou autocomplacente. Mesmo quando toca em um assunto potencialmente perigoso - a atração do trintão Willie pela adolescente Marty - o roteiro substitui o peso de uma polêmica pela leveza da citação de Nabokov e sua Lolita. Ao defender a imaturidade masculina mesmo quando ela tem consequências pouco nobres ou altruístas, tanto Rosenberg quanto o diretor Ted Demme tem o cuidado de não parecerem machistas ou misóginos: eles parecem dizer, através dos diálogos certeiros e quase melancólicos em determinados momentos, que seus personagens não são maus, são apenas infantis e, portanto, dotados de um egoísmo inerente à sua condição. E para isso, eles contam com um elenco excelente, que se desincumbe com maestria das armadilhas de uma trama que prescinde de heróis ou vilões.

Timothy Hutton - que ganhou um Oscar de coadjuvante aos 19 anos por "Gente como a gente" (80) - sai-se bem como o desnorteado Willie, um homem perdido entre a juventude e a maturidade que vê no possível envolvimento com uma adolescente sua última chance de prender-se de vez ao passado. Uma Thurman desfila linda e carismática pela tela como a sedutora Andera e Michael Rapaport faz o papel de adorável paspalho que se tornaria sua marca registrada - o mesmo que acontece com Rosie O'Donnell, que rouba a cena com sua desbocada e realista Gina em pelo menos uma cena memorável, quando discursa sobre a ditadura da beleza feminina ideal dos homens (tema também de um diálogo brilhante proferido pelo personagem de Rapaport). Junto a eles, as duas oscarizadas Natalie Portman - ainda menina - e Mira Sorvino completam uma equipe iluminada, que vem suas cenas comentadas pela adequada e agradável trilha sonora de David A. Stewart.

Ah, o filme que Rosenberg escreveu antes de esconder-se em sua cidadezinha chegou às telas em 1997: era o blockbuster "Con Air, a rota da fuga"... que não tem, perceptivelmente, nada a ver com o delicioso "Brincando de seduzir".

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