segunda-feira

TERAPIA DE RISCO

TERAPIA DE RISCO (Side effects, 2013, Endgame Entertainment/FilmNation Entertainment/Di Bonaventura Pictures, 106min) Direção: Steven Soderbergh. Roteiro: Scott Z. Burns. Fotografia: Peter Andrews (Steven Soderbergh). Montagem: Mary Ann Bernard (Steven Soderbergh). Música: Thomas Newman. Figurino: Susan Lyall. Direção de arte/cenários: Howard Cummings/Rena DeAngelo. Produção executiva: Douglas E. Hansen, Michael Polaire, James D. Stern. Produção: Scott Z. Burns, Lorenzo di Bonaventura, Gregory Jacobs. Elenco: Rooney Mara, Jude Law, Catherine Zeta-Jones, Channing Tatum, Ann Dowd, Mamie Gummer. Estreia: 08/02/13



Em “Contágio” (11), Steven Soderbergh já havia, de leve, provocado uma discussão a respeito da ganância da indústria farmacêutica, mas deu à trama a mesma importância que aos outros focos do filme – irresponsabilidade da mídia, o pânico diante de uma epidemia, o avanço da barbárie diante do imprevisto. Em seu trabalho seguinte, “Terapia de risco”, ele volta a esbarrar no assunto – dessa vez enfatizando os remédios antidepressivos – mas novamente desvia de uma discussão relevante e instigante para abraçar um gênero específico (no caso o suspense) e contar uma história que, a despeito de seu começo promissor, descamba para uma série de reviravoltas forçadas e inverossímeis. Mais uma vez o Soderbergh comercial – que assinou coisas terríveis como “Magic Mike” e alguns bons entretenimentos, como “Onze homens e um segredo” – ganhou do Soderbergh artista criativo e socialmente ativo – que ganhou a Palma de Ouro em Cannes por “sexo, mentiras e videotape” e o Oscar de melhor diretor por “Traffic”. Quem acabou perdendo foi o público.
Não que o grande público se incomode com o fato de o roteiro abandonar a chance de discutir um problema sério como o abuso de remédios controlados e a forma como a indústria que os fabrica conduz sua comercialização. O problema é que os dois primeiros terços do filme conduzem a narrativa por um caminho específico para, de uma hora para outra – com o objetivo de espantar a plateia – distorcer a trama de forma a fazê-la caber em um final-surpresa que enfraquece todo o tom sério e excitante que vinha sendo mostrado até então. Em resumo, “Terapia de risco” tem um começo promissor e um final decepcionante que não faz jus à carreira de seu diretor.
A trama tem início quando o jovem Martin Taylor (Channing Tatum) sai da cadeia, depois de quatro anos preso pelo crime de tráfico de informações financeiras. Quem o espera do lado de fora do presídio é sua esposa, Emily (Rooney Mara, de “Os homens que não amavam as mulheres, irreconhecível e sempre ótima atriz), que teve sua vida completamente desestruturada com a condenação do marido. Depois de perder o bebê que esperava e ter tido seu estilo de vida radicalmente transformado, a jovem acabou por tornar-se dependente de antidepressivos e, mesmo com a volta do marido, parece não dar sinais de melhora. Pelo contrário, duas tentativas de suicídio a levam até o doutor Jonathan Banks (Jude Law), que depois de algumas consultas propõe a ela que tome parte nos experimentos de uma nova droga que está sendo testada em pacientes em avançado estado de depressão. Emily aceita fazer parte do teste, mas um dos efeitos colaterais – sonambulismo – acaba por fazê-la cometer um homicídio. No banco dos réus, ela acaba por tornar-se alvo de uma polêmica: quem é, afinal, o responsável pelo crime? Ela, a indústria farmacêutica ou seu médico?



Esse ponto de partida – que toma boa parte dos dois terços iniciais do filme – é empolgante, inteligente e prende a atenção do público sem fazer esforço, graças em boa parte às interpretações do elenco e da direção segura e sóbria de Soderbergh. As coisas começam a degringolar quando Banks, sentindo-se acuado diante das acusações de irresponsabilidade e negligência médica, passa a investigar o passado de Emily e chega até sua médica anterior, Victoria Seibert (Catherine Zeta-Jones), uma mulher bem-sucedida que parece ter muito mais a esconder do que mostra em um primeiro olhar. A real ligação entre Emily e Victoria – o grande segredo do filme – vem à tona perto do final, e é aí que o roteiro põe tudo a perder. Sem querer estragar a surpresa dos que se arriscarem a uma sessão (e no final das contas até vale uma espiada, em especial pelo elenco), é um desfecho que parece jogado na tela, sem a preocupação básica de parecer realista.
Ok, Steven Soderbergh já fez coisas muito piores – “Magic Mike” à frente – mas é sempre triste ver um cineasta capaz de pequenas obras-primas como “Irresistível paixão” e “Traffic” se deixar cair na vala dos diretores puramente comerciais, optando pela mediocridade em detrimento da criatividade e da ousadia. “Terapia de risco” é um filme de gênero e logicamente deve seguir diretrizes já estabelecidas e consagradas, mas isso não justifica o golpe baixo que é dado nas expectativas do espectador que espera mais do que ser simplesmente pego de surpresa por um roteiro quase preguiçoso. Felizmente o elenco faz o que pode para manter o interesse. E consegue. Porém, Soderbergh poderia voltar a ser o diretor inteligente que um dia se propôs a ser.

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