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AS DUAS FACES DE JANEIRO

AS DUAS FACES DE JANEIRO (The two faces of January, 2014, Working Title Films, 96min) Direção: Hossein Amini. Roteiro: Hossein Amini, romance de Patricia Highsmith. Fotografia: Marcel Zyskind. Montagem: Nicolas Chardeuge, Jon Harris. Música: Alberto Iglesias. Figurino: Steven Noble. Direção de arte/cenários: Michael Carlin/Dominic Capon. Produção executiva: Tim Bricknell, Ron Halpern, Max Minghella. Produção: Tim Bevan, Eric Fellner, Robyn Slovo, Tom Sternberg. Elenco: Viggo Mortensen, Kirsten Dunst, Oscar Isaac, Daisy Bevan. Estreia: 11/02/14 (Festival de Berlim)

Quem conhece a obra de Patricia Highsmith sabe que uma de suas maiores características é a elegância com que ela reveste até mesmo os atos mais cruéis cometidos por seus personagens - vias de regra dotados de um carisma que quase obriga o leitor a compactuar com tais atitudes. Foi assim que aconteceu com Tom Ripley (interpretado no cinema por Matt Damon, Alain Delon e John Malkovich) e com Bruno Anthony (a quem Robert Walker deu vida no clássico hitchcockiano "Pacto sinistro"). E é quase isso que acontece também com Chester MacFarland, o protagonista do envolvente "As duas faces de janeiro", estreia na direção do iraniano Hossein Amini - também roteirista do impactante "Drive", estrelado por Ryan Gosling. Vivido por um Viggo Mortensen esbanjando charme e equilibrando-o com um muito apropriado tom ameaçador, MacFarland une-se à galeria de tipos ambíguos criados por Highsmisth em um filme que, a despeito de sua passagem quase ignorada pelas telas de cinema, merece uma segunda chance de ser descoberto.

Sem apelar para a violência desnecessária e dotando sua narrativa com um compasso suave que combina com o calor do sol que banha as belas paisagens gregas que lhe servem de cenário - fotografadas com inspiração por Nicolas Chardeuge - Amini mistura em seu filme a tensão característica dos livros da escritora texana, uma sensualidade reprimida e um senso de imprevisibilidade que conduz o espectador por um labirinto de reviravoltas capaz de seduzir qualquer um até o minuto final. Revelando somente aos poucos as reais intenções e personalidades de seus protagonistas e proporcionando ao público a chance de acompanhar uma história inteligente e calcada na sutileza ao invés de bombardeá-lo com sangue e efeitos visuais, "As duas faces de janeiro" pode não arrebatar completamente - há uma certa quebra de ritmo em sua metade - mas é muito melhor do que a maioria dos filmes policiais incensados pela crítica.


A trama começa em Atenas, em 1962, quando o casal de americanos Chester (Viggo Mortensen) e Colette (Kirsten Dunst em mais uma memorável atuação) chama a atenção do guia turístico Rydal (Oscar Isaac, sem dúvida um dos atores mais competentes surgidos em Hollywood na segunda década dos anos 2000), que complementa sua renda enganando jovens turistas desavisadas, que se deixam seduzir por seu charme e inteligência. Impressionado com a sofisticação do casal - e principalmente pela beleza de Colette - Rydal acaba por servir de acompanhante aos dois durante sua estada na cidade. Por um acaso do destino, porém, ele acaba sendo testemunha de um crime cometido por Chester - na verdade um golpista que está no país fugindo de uma série de credores. Se oferecendo para ajudar o novo amigo a escapar incólume da região, o rapaz se aproveita para ficar ainda mais próximo de Colette, também atraída por sua juventude e vitalidade. Triângulo amoroso formado, resta aos três desvencilhar-se das investigações policiais e lidar com novos segredos que podem vir à tona.

Produzido com extremo requinte - a reconstituição de época é primorosa e a trilha sonora de Alberto Iglesias pontua com precisão o desenvolvimento da história - "As duas faces de janeiro" é um filme que merece encontrar seu público também porque é uma alternativa consistente a obras que tentam cativar a audiência com explosões sem sentido e violência gratuita. Nadando contra a corrente e privilegiando a história e os personagens mais do que tais artifícios, Hosseim Amini acabou por realizar uma estreia alvissareira, que denota um cineasta inteligente e sensível que tem tudo para tornar-se um nome bastante reconhecido nos próximos anos. Que venha um novo trabalho!

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