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CAKE: UMA RAZÃO PARA VIVER

CAKE: UMA RAZÃO PARA VIVER (Cake, 2014, Lou Films/Echo Films/We're Not Brothers Productions, 102min) Direção: Daniel Barnz. Roteiro: Patrick Tobin. Fotografia: Rachel Morrison. Montagem: Kristina Boden, Michelle Harrison. Música: Christophe Beck. Figurino: Karyn Wagner. Direção de arte/cenários: Joseph T. Garrity/Lisa Son. Produção executiva: Jennifer Aniston, Yu Wei-Chung, Patty Long, Shyam Madiraju. Produção: Ben Barnz, Mark Canton, Kristin Hahn, Courtney Solomon. Elenco: Jennifer Aniston, Chris Messina, Sam Worthington, Anna Kendrick, Felicity Huffman, William H. Macy, Adriana Barraza, Mamie Gummer, Lucy Punch. Estreia: 08/9/14 (Festival de Toronto)

Conhecida do grande público por sua atuação como a mimada Rachel Green da série "Friends" - que durou dez temporadas, ganhou dezenas de prêmios e se mantém como uma das mais queridas da história - a atriz Jennifer Aniston foi a única do elenco a conseguir romper com relativo sucesso o limite entre sua carreira na televisão e no cinema. Presença cativa em comédias românticas de qualidades variadas, ela surpreendeu meio mundo em 2014 quando surgiu desglamorizada e repleta de nuances dramáticas em "Cake, uma razão para viver", que estreou no Festival de Toronto e lhe rendeu tanto elogios unânimes quanto indicações ao Golden Globe e ao Screen Actors Guild Awards - infelizmente, a esperada e merecida lembrança por parte da Academia não chegou, mas é inegável que seu trabalho, sério e denso, empurrou-a em direção a um patamar de respeito artístico junto à comunidade cinematográfica que poucos atores oriundos da TV conseguiram atingir.

Dirigido pelo mesmo Daniel Barnz que cometeu o indescritível "A fera" (2011), "Cake" é um drama intimista e delicado, com pegada de cinema europeu em seu enfoque naturalista e pouco dado a soluções fáceis - que o público não espere por intermináveis cenas de choro histérico ou uma história de superação pessoal como aquelas que Hollywood adora contar de forma enfeitada e envernizada por momentos de humor constrangedor. O roteiro de Patrick Tobin, a direção de Barnz e principalmente a interpretação de Aniston (e do elenco coadjuvante formado por rostos relativamente conhecidos da plateia) afastam o filme do convencional, e se isso pode incomodar a quem procura mais do mesmo, funciona à perfeição para aqueles que gostam de envolver-se com uma história que apresenta gente normal, com problemas reais e dificuldades palpáveis de superar seus obstáculos. E quem acha que Aniston é bonita demais para convencer como uma mulher sofrida vai se surpreender com a maturidade e a coragem com que a ex-mulher de Brad Pitt se entrega a seu melhor papel no cinema até agora.


Aniston vive, de corpo e alma, Claire Bennett, uma advogada que frequenta um grupo de apoio para mulheres que convivem com algum tipo de dor física crônica. Coberta de cicatrizes depois de um acidente de carro que matou seu filho - e consequentemente a afastou do marido, Jason (Chris Messina) - ela tenta superar suas angústias de todas as formas possíveis, desde hidroginástica até os encontros do grupo comandado por Annette (Felicity Huffman), mas são apenas os comprimidos que consegue sem receita que eventualmente dão algum resultado. Contando sempre com a ajuda da fiel empregada doméstica, a mexicana Silvana (Adriana Barraza, indicada ao Oscar por "Babel"), Claire torna-se obcecada com o suicídio de Nina Collins (Anna Kendrick, indicada ao Oscar por "Amor sem escalas"), uma colega do grupo de apoio que jogou-se de uma ponte e deixou para trás o marido e o filho pequeno. Sem razão aparente, ela procura o viúvo, Roy (Sam Worthington), e inicia com ele uma amizade inusitada que poderá ajudar a ambos a superar seus tormentos pessoais.

Oferecendo aos poucos as informações sobre seus personagens e deixando que o público se envolva devagar com seus problemas, "Cake" ainda injeta um tantinho de surrealismo ao apresentar diálogos imaginários entre Claire e Nina - que a acusa de estar dando em cima de seu marido - e induz o espectador a um estado de cumplicidade com a protagonista. Mesmo que Claire não seja exatamente simpática (e não se espera isso de alguém que perdeu tanta coisa em tão pouco tempo, afinal), é difícil não sentir empatia por sua dor e seu desespero silencioso, muitas vezes revelado em uma agressividade se não compreensível, ao menos perdoável. Sua trajetória em relação a uma paz de espírito desejada e talvez afastada por uma série de autossabotagens é recheada de grandes momentos dramáticos, felizmente espalhados pelo roteiro com cuidado e delicadeza. "Cake" é um belo e simples filme sobre a vida e suas tristezas - e de como elas podem, paradoxalmente, unir as pessoas.

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