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NA PRÓXIMA, ACERTO O CORAÇÃO

NA PRÓXIMA, ACERTO O CORAÇÃO (La prochaine fois je viserai le coeur, 2014, Sunrise Films/Les Productions du Trésor, 111min) Direção: Cédric Anger. Roteiro: Cédric Anger, livro de Yvan Stefanovitch, Martine Laroche. Fotografia: Thomas Hardmeier. Montagem: Julien Leloup. Música: Grégoire Hetzel. Figurino: Jurgen Hoering. Direção de arte: Thierry François. Produção: Alain Attal, Anne Rapczyk. Elenco: Guillaume Canet, Ana Girardot, Jean-Yves Berteloot, Patrick Azam. Estreia: 23/8/14

Filmes sobre serial killers abundam no cinema norte-americano, em produções que variam entre o sublime e o lugar-comum, e se tornaram, de certa forma, um termômetro para mostrar talento de seus realizadores. Mais acostumada com dramas existenciais e comédias inteligentes, a cinematografia francesa já não tem uma lista tão extensa de obras a respeito de criminosos assustadores e cruéis, mas "Na próxima, acerto o coração" tenta amenizar essa falha. Contando a história real de um assassino de mulheres que (pasmem!) fazia parte do corpo policial da própria região onde ocorriam as mortes, o cineasta e roteirista Cédric Anger pode até não atingir todas as vastas possibilidades que a trama oferece, mas merece aplausos pela coragem em investir em um gênero pouco comum na filmografia de seu país.

Vivido pelo ator e cineasta Guillaume Canet - companheiro de aventuras de Leonardo DiCaprio em "A praia" (2000) e casado com Marion Cottilard na vida real - o protagonista do filme é o pacífico e silencioso policial Franck Neuhart, um rapaz solteiro que mora sozinho em um pequeno apartamento da região de Oise, perturbada por uma série de crimes que vitima jovens mulheres e não oferece muitas pistas sobre sua autoria. Pressionado pela família a arrumar uma namorada, ele se envolve (ao menos aparentemente) com a jovem que limpa sua casa, Sophia (Ana Girardot), mas o que ninguém desconfia - nem seus parentes, nem seus colegas de trabalho e tampouco Sophie - é que Franck é o responsável pelos homicídios. Sua compulsão em cometer os crimes é tanta que ele nem sequer hesita em arriscar-se a ponto da irresponsabilidade - e quando as autoridades começam a apertar o cerco nas investigações, ele se vê repentinamente cercado pelos próprios aliados.


Despido de qualquer tipo de charme, Caunet é o grande destaque de "Na próxima, acerto o coração" - uma ameaça que o homicida fazia em suas cartas para a polícia, com quem brincava ao estilo Jack, o Estripador. Em uma atuação que evita o previsível - olhares insanos, gestual ameaçador - ele constrói um psicopata mais próximo do real do que do cinema. Seu Franck é quase apático no convívio diário com as pessoas que o cercam, um homem banal do qual jamais se poderia esperar atos tão violentos quanto os cometidos por ele, e é aí que reside seu maior perigo à sociedade. Sua interpretação consegue até mesmo disfarçar o ritmo um tanto irregular do roteiro, baseado em um livro que conta a história real e que acrescenta cenas fictícias para complementar o arco dramático dos personagens. Essa opção - de um lado acertada em dar mais consistência às relações de Franck com a família e os colegas - acaba, porém, por diluir a tensão que se espera de um filme de suspense, ainda que provavelmente a intenção do próprio Anger tenha sido a de examinar mais a consciência e a rotina do serial killer do que exatamente promover sustos e arrepios na plateia. Visto mais como um drama do que como um filme policial, a obra do cineasta é uma antítese de "Zodíaco" e "Seven, os sete crimes capitais", dois dos maiores exemplares do gênero em Hollywood - e sintomaticamente dirigidos pelo mesmo David Fincher.

Menos violento do que sua trama poderia fazer supor - e ainda assim bem mais sangrento do que muitos de seus conterrâneos - "Na próxima, acerto o coração" é um interessante misto entre filme policial e drama psicológico. Não é genial (poderia ter uns bons quinze minutos a menos) mas é ousado em seu enfoque e não tem medo das comparações com produções mais comerciais (leia-se americanas). Além disso, comprova o talento de Guillaume Canet e oferece ao público algumas cenas que justificam sua classificação como suspense (poucas, é verdade, mas bem intensas e muito bem dirigidas). É uma opção muito bem-vinda à mesmice de muitos produtos que parecem todos iguais.

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